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Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
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O julgamento de Jair Bolsonaro e mais sete aliados seus, acusados pela Procuradoria-Geral da República de integrar uma organização criminosa responsável pelo golpe de Estado de 8 de janeiro, continuou nesta quarta-feira (10/9), na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), com o voto do ministro Luiz Fux. O ministro foi contra o voto do relator do caso, Alexandre de Moraes, que condenou todos os participantes do grupo, pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Na véspera, o ministro Flávio Dino acompanhou o voto de Moraes, porém divergiu em relação às penas do general e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno; Alexandre Ramagem, ex-diretor dea Agência Brasileira de Inteligência; e do general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, que quer sejam rediscutidas. Além da manhã desta quarta-feira, há sessões da Primeira Turma reservadas para o julgamento da trama golpista na quinta-feira e na sexta, com previsão de encontros pela manhã e à tarde.
O réus são: Jair Bolsonaro, ex-presidente da República; Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal; Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro na chapa de 2022; e Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Voto além do esperado – Já era esperada de Fux uma posição divergente da do relator. Mas o ministro foi muito mais além, votando pela anulação de todo o processo, alegando falta de competência do STF para julgar os réus. Votou pela incompetência absoluta da Primeira Turma, mas, contraditoriamente, pela competência do plenário do Supremo para analisar o caso.
Vale lembrar que Fux foi um dos três ministros do STF não alcançados pelas sanções do presidente de extrema-direita dos Estados Unidos, Donald Trump, entre elas a suspensão dos vistos de entrada no país norte-americano. Para defender Bolsonaro, Trump vem usando, também, ataques tarifários contra as exportações brasileiras, a pedido de Eduardo Bolsonaro, ferindo as normas internacionais, interferindo em assuntos internos, indo contra a soberania do Brasil.
Os outros dois ministros do STF que não sofreram sanções foram André Mendonça e Nunes Marques, estes, nomeados por Bolsonaro. Moraes, além de ter a ordem de visto cassada, sofre a pressão dos efeitos da Lei Magnitsky, usada pelo governo Trump, sendo impedido de realizar operações financeiras com empresas estadunidenses, como bancos e cartões, e também com empresas brasileiras que tenham negócios com os EUA.
As alegações de Fux – Ao considerar o STF incompetente para julgar Bolsonaro e seus parceiros na tentativa de golpe, Fux reforça o discurso da extrema-direita brasileira e do governo Trump de que Bolsonaro ‘está sendo perseguido’. O ministro alegou que “os réus não têm prerrogativa de foro, porque não exercem função prevista na Constituição; se ainda estão sendo processados em cargos por prerrogativa, a competência é do plenário do STF. Impõe-se o deslocamento do feito para o órgão maior da Corte”, justificou. “Ou o processo deve ir para o plenário ou tem de descer para a primeira instância”, reforçou.
Segundo Fux, “ao rebaixar a competência original do plenário para uma das turmas, estaríamos silenciando as vozes de ministros que poderiam esterilizar a forma de pensar sobre os fatos a serem julgados nesta ação penal. A Constituição Federal não se refere às Turmas, ela se refere ao plenário e seria realmente ideal que tudo fosse julgado pelo plenário do STF com a racionalidade funcional”, disse. “Estamos diante de uma incompetência absoluta” para julgar a ação.
‘Tsunami de informações’ – Fux acolheu, ainda, o argumento dos advogados dos réus de que houve cerceamento da defesa, mas não porque não lhes foi garantido este direito, e sim, ‘devido à falta de tempo adequado’ para que os advogados analisassem todo o material levantado nas investigações.
Segundo ele, houve um “tsunami de dados”, sendo este, mais um motivo para anular o processo. Disse de orelhada, mostrando que usava informações que não eram suas. “Eu não sou especialista. A quantidade chega a 70 terabytes. Fui pesquisar isso, nem acreditei, porque são bilhões de páginas”, disse. “E, apenas em 30 de abril de 2025, portanto mais de um mês após o recebimento da denúncia e menos de 20 dias antes do início do depoimento das testemunhas, foi proferida decisão deferindo acesso à íntegra de mídias e dos materiais apreendidos na fase investigatória”, insistiu.
Alegou também que o material foi disponibilizado ‘sem estar classificado’, dificultando a análise pelas defesas e por ele próprio. “Também senti essa dificuldade”, argumentou Fux. Segundo ele, a falta de acesso adequado da defesa ao conteúdo da investigação impede que advogados possam encontrar eventuais provas favoráveis aos réus no material apreendido.
Para Fux, grupo golpista não formava organização criminosa – Mesmo com fartas provas sobre todo o processo de evolução do golpe que culminou na depredação dos prédios do STF, Congresso Nacional e do Palácio do Planalto, em 8 de janeiro – passando pela bomba colocada no Aeroporto de Brasília e do Plano Punhal Verde e Amarelo, que previa o assassinato de Moraes, do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e do seu vice, Geraldo Alckmin – Fux votou contra a condenação do grupo golpista por organização criminosa.
Segundo o ministro do STF, a lei prevê que este tipo de crime só poderia existir caso houvesse estabilidade do grupo acusado e ações sistemáticas de delitos por parte dos envolvidos. Sustentou que para este tipo de crime ‘seria necessário haver uma estrutura organizacional significando algum tipo de hierarquia com chefes e chefiados’. Segundo o ministro, nenhuma destas exigências da lei teriam sido observadas pelo relator para justificar a acusação de organização criminosa.
A moderação demostrada em seu voto nesta quarta-feira na ação que julga o ex-presidente Bolsonaro, em nada faz lembrar o comportamento de Fux, que agiu com dureza em relação aos acusados pelo juiz Sérgio Moro, nos casos do mensalão e da Lava Jato. O ministro chancelou todas as decisões da Lava Jato, com direito a receber elogios do ex-juiz Sergio Moro e do procurador Deltan Dallagnol.