Sexta, 02 Mai 2025 12:58

Jornalista explica por que a grande mídia defende os interesses dos bancos e demais empresários

O jornalista Paulo Flores (ao centro) com a equipe de Comunicação da Contraf-CUT. O jornalista Paulo Flores (ao centro) com a equipe de Comunicação da Contraf-CUT.

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Imprensa SeebRio      

Nesta entrevista, Paulo Flores fala sobre os interesses que estão por trás da mídia empresarial. Avalia também o comportamento destes grandes meios de comunicação em relação ao governo Lula. Paulo Flores é jornalista há 25 anos e faz parte da equipe da Secretaria de Comunicação da Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT). Formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMSP), é especialista em Marketing Político pela Universidade de São Paulo (USP), já tendo trabalhado na mídia empresarial e em assessoria de imprensa parlamentar e de outras entidades sindicais bancárias, como a Fetec/SP.

Imprensa SeebRio – Em 1º de janeiro de 2023, Luiz Inácio Lula da Silva tomou posse como o 39º presidente do Brasil em seu terceiro mandato. Como você avalia a cobertura que tem sido feita pela mídia empresarial sobre o governo Lula nestes dois anos?

Paulo Flores – Quando você me pede para fazer uma avaliação da “mídia empresarial”, já me dá um viés para a análise. Todo veículo de comunicação tem um dono, que é um empresário. Ou seja, se o dono é um empresário, seu veículo de comunicação vai defender o lado do empresariado. Então, todas as propostas, deste ou de qualquer outro governo, que possa causar algum entrave para o empresariado, vai receber críticas deste tipo de mídia.

Então, minha análise, neste sentido, é que a “mídia empresarial” está fazendo muito bem o papel dela de “mídia empresarial”. Relativizando tudo o que o governo faz, ou tenta fazer, de bom e destacando qualquer deslize.

Mas, além disso, precisamos levar em conta que estamos vivendo um período de ascensão da direita em todo o mundo. E, no Brasil, temos um Congresso Nacional com maioria absoluta conservadora e de direita nas duas casas. Assim, o governo não consegue avançar muito em pautas necessárias para a classe trabalhadora e fica ainda mais sujeito a críticas da “mídia empresarial”, mas também da própria população que elegeu o governo, pois o povo não entende, ou não quer saber que não é o governo que não faz o que precisa ser feito, é o Congresso que o amarra.

Imprensa SeebRioÉ um contexto complicado para o Brasil.

Paulo Flores – Sim. Outro agravante, que faz inclusive com que esta situação se prolongue, é que a direita se embrenhou em espaços sociais que antes eram ocupados pela esquerda. Espaços que antes eram ocupados pelas Comunidades Eclesiais de Base, as CEBs, e pelas pastorais sociais das igrejas cristãs tradicionais, principalmente católicas, que seguiam uma linha ligada à teologia da libertação, agora estão nas mãos de neopentescostais. Em cada cantinho, em cada comunidade, há uma, ou mais, igrejas, geralmente nas mãos de algum “pastor” que segue a linha da teologia da prosperidade e dá uma linha de “negócio” para sua empresa, quer dizer, igreja. Esse “pastor-empresário” busca prosperidade para seu negócio mesmo que, para isso, tenha que defender a manutenção da conjuntura de privilégios para uns poucos à custa da exploração de muitos, como todo empresário. O que é o inverso do que é pregado por Jesus Cristo.

Esta mesma situação se repete em outros espaços sociais. Nas escolas, que antes funcionavam grêmios estudantis e os professores debatiam questões sociais nas aulas, agora viraram ambiente para os conteúdos da Brasil Paralelo, uma instituição de direita que se infiltrou nas escolas e vende conteúdo de direita para as aulas. E assim acontece em vários ambientes sociais.

Quem leu Gramsci, sabe da importância destes espaços para a disputa da hegemonia social. E, por isso, além de vencermos a “mídia empresarial” com veículos de comunicação alternativos, a esquerda e o governo de esquerda precisa voltar a ocupar estes espaços na estrutura organizada da sociedade civil para tentar reverter a correlação de forças.

Imprensa SeebRio – Você vê neste comportamento dos grandes veículos de comunicação uma forma de defender os interesses dos seus anunciantes, bancos, agronegócio e outras grandes empresas?

Paulo Flores – A defesa dos anunciantes é apenas um ponto. Este tipo de cobertura vai muito além da defesa dos anunciantes. Estamos falando de luta de classes. Omitem os benefícios da elite empresarial e financeira e jogam a culpa na previdência social, por exemplo. Isso não é apenas defesa dos anunciantes. É luta de classes.

Imprensa SeebRioJornais, rádios e tevês repetem que ‘o mercado não gostou’, por exemplo, do tamanho do ajuste fiscal ‘pois foi insuficiente’ ou da isenção do imposto de renda para quem ganha R$ 5 mil e da redução até R$ 7 mil, ou da cobrança de imposto aos super ricos. Quem afinal é este ‘mercado’ e por que tem tanto poder sobre os meios de comunicação?

Paulo Flores – A explicação é complexa. Então, vou falar grosso modo, havendo risco de alguma imprecisão. O que eles reclamam é do tamanho do déficit fiscal do governo. Queriam mais cortes de gastos para sobrar mais dinheiro público para eles. É que este déficit é criado quando o governo, sem dinheiro, emite “papéis da dívida pública”. Muitos destes papéis são remunerados com juros pós-fixados. Compra-se o título, e, na hora da venda, o governo tem que pagar a taxa de juro do momento. A maioria destes papéis estão nas mãos dos bancos. Que ganham com os juros altos cobrados da população e mais ainda com os juros altos pagos pelo governo. Então, se o governo baixa os juros, ele sai ganhando muito e a população também. E este é o mercado financeiro, que não quer a isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil, ou não quer o aumento do salário mínimo, porque se não o governo pode não honrar o pagamento dos juros absurdos destes papeis, ou terá que cobrar algum imposto dos especuladores, que querem apenas ganhar, sem pagar nada.

Imprensa SeebRioQuais os principais avanços postos em prática pelo governo Lula que a mídia não fala?

Paulo Flores – O Lula é um exímio articulador político. Mesmo com este Congresso Nacional com maioria absoluta de oposição, ele conseguiu aprovar uma reforma tributária que traz benefícios para a população e impõe algum tipo de cobrança para os super ricos. A taxação dos fundos exclusivos, que são fundos de investimentos fechados de grandes investidores e das offshore, por exemplo, é um destes avanços. Mas, a isenção de IR para quem ganha até dois salários-mínimos e a retomada da política de valorização do salário-mínimo são dois exemplos que devem ser muito valorizados, pois interessa à base da pirâmide social. E, se for aprovada a isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil e concedidos descontos a quem ganha até R$ 7 mil, será um avanço ainda maior. Mas, é claro que é preciso haver uma taxação de quem ganha mais, para que o governo consiga continuar prestando os serviços públicos que beneficia esta população. Se não, ele dará com uma mão e tirará com outra. É por isso que todos os trabalhadores, que querem a isenção do IR, precisam também lutar para a taxação dos super ricos e daqueles que têm alta renda.

E só de o Lula ter colocado este debate para a sociedade já é um avanço. Pois aqui sempre se taxou o consumo, que penaliza o mais pobre e beneficia o mais rico. Taxar a renda e a riqueza é a melhor forma de promover a justiça tributária e a distribuição da riqueza que o país produz.

Imprensa SeebRio – Qual a importância das mídias que são independentes do grande capital, incluindo aí a mídia sindical e dos movimentos sociais em geral, mas também o ‘247’, ‘Revista Fórum’, ‘Terapia Política’, ‘Mídia Ninja’, ‘Meio’ e ‘Outras Palavras’, entre outras, que tentam ser uma alternativa aos grandes meios de comunicação?

Paulo Flores – Vladimir Lenin nos ensinou que a classe trabalhadora precisa ter seu próprio meio de comunicação. Não podemos ficar reféns das informações que nos são fornecidas pelos veículos de comunicação empresariais. Então, estes veículos são importantes. E temos que trabalhar para, cada vez mais, termos veículos de qualidade, que nos trazem informações confiáveis e nos ajudem a termos uma visão crítica da sociedade e até mesmo do governo que a gente ajudou a eleger, para que a gente consiga ajudá-lo a melhorar e atuar sempre para melhorar as condições de vida do trabalhador.

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